sábado, 4 de junho de 2005

IgNóbeis do Canhoto [1]

« Para mim, a mentalidade portuguesa é trágica, mais do que dramática. » (Michel Maffesoli, Pública, 29/05/2005)
Pois, dramático é que alguém que se apresenta como sociólogo possa fazer uma afirmação destas quando entrevistado na qualidade de sociólogo.
Trágico é que a concepção de sociologia subjacente a “achismos” como o da citação tenha desembocado no patrocínio de uma tese de doutoramento em sociologia, escrita por uma astróloga, sustentando o ponto de vista da astrologia, defendida e aprovada, em Abril de 2001, na Universidade de Paris V. (1)
Nessa tese, de Elizabeth Teissier, aprendemos, por exemplo, que a prática da astrologia tem importantes pontos de contacto com as categorias weberianas de compreensão e de tipo-ideal (um signo seria um tipo-ideal!), bem como que Simmel escreveu o que escreveu porque era do signo dos Peixes!
Na entrevista de Maffesoli à Pública aprendemos que não há já no nosso mundo lugar para a política e que o medo do desemprego é simplesmente uma projecção dos intelectuais (e quem poderia pensar que a palavra intelectual teria, na boca de quem se apresenta como “sociólogo”, uma conotação negativa!).
Não podiam desempregá-lo?

(1) Para uma discussão crítica pormenorizada sobre este lamentável acontecimento, ver “Une astrologue sur la planète des sociologues ou comment devenir docteur en sociologie sans posséder le métier de sociologue”, capítulo 13 do livro de Bernard Lahire, L’Esprit Sociologique, La Découverte, Paris, 2005, pp. 351-387. Este sim, um sociólogo.
http://socio.ens-lsh.fr/lahire/index.php