terça-feira, 6 de dezembro de 2005

Pelo direito ao bom-nome, pela verdade e por justiça

1. Há dois anos e meio que luto pelo meu bom-nome, pela verdade e por justiça. Com o trânsito em julgado do Acordão do Tribunal da Relação de Lisboa que confirmou o despacho de não pronúncia do Tribunal de Instrução Criminal de Lisboa foi dado um passo decisivo nessa luta.

2. Este processo permitiu-me perceber que, em Portugal, hoje, não basta ser inocente para ser tratado como tal.
Algures, alguém, um dia, desencadeou as operações que culminaram na brutal difamação que sofri. Estou certo que também um dia, alguém, algures descobrirá o que aconteceu e como.
Sei, no entanto, que quem conduziu o inquérito judicial a meu respeito, agiu sem presumir sequer a possibilidade da minha inocência.
Pelo contrário, fui humilhado, ofendido, moralmente violentado. Fui alvo de uma perseguição que passou por uma prisão já declarada ilegal e uma acusação que agora foi judicialmente afirmado que nunca deveria ter existido.
O meu direito ao bom-nome foi repetidamente violado. Os elementos de prova que contrariavam a minha pretensa incriminação foram ignorados, desvalorizados e até retorcidos, em vãs tentativas deles extrair o contrário do que demonstravam.
Toda a minha vida seria muito diferente se essa acusação ignóbil não tivesse sido proferida.

3. Para contrapor a máquina tão poderosa e trituradora como a aliança que se estabeleceu entre certas fontes anónimas dos meios judiciais e certos meios de comunicação social, tinha apenas a minha palavra, o labor da minha defesa e os elementos de prova que reuni.
Compreendo, embora com profundo sofrimento, os meus concidadãos que, perante a actuação da direcção do inquérito judicial, que tinha sido avocado pelo próprio Procurador-Geral da República, se deixaram invadir por dúvidas a meu respeito.
Mas peço-lhes também que compreendam a minha indignação e, aos que a não compreenderam antes, que a compreendam agora.
A violência da perseguição que sofri é tal que seria cobardia quedar-me pelo afastamento da ameaça de um julgamento por crimes que não cometi.
Passo após passo, até onde as minhas capacidades o permitirem, continuarei a demonstrar a minha inocência, a pedir responsabilidades por todo o sofrimento que me foi infligido e à minha família e a pedir reparação pelos danos severos e persistentes que me foram causados.

4. Ou aquilo por que passei ao longo deste processo está inscrito nas regras do nosso sistema judicial e estou errado na convicção que sempre reafirmei na justiça do Portugal democrático, ou só foi possível acontecer assim porque houve desrespeito por essas regras da parte de quem teve responsabilidades na condução da investigação e então tenho o dever, por mim, pelo sistema de justiça e para que outros não sejam submetidos ao mesmo, de levar até às últimas consequências a denúncia e exigência de reparação pelas consequências severas e duradouras de tais procedimentos.
Acresce que as pessoas que actuaram em relação a mim deste modo estavam investidas pela comunidade de um estatuto que lhes confere direitos e deveres especiais.
Em democracia ninguém está acima da lei e ninguém pode ser isentado de responsabilidade pelos seus actos. Por isso, pedi à minha defesa, dirigida pelo Dr. Celso Cruzeiro, que accionasse os procedimentos legais necessários para que sejam reparados os danos que essas condutas e omissões de deveres me causaram.

5. A minha acção não é uma retaliação, entendo-a como o meu contributo possível, neste momento, para o apuramento da verdade.
Ajo convicto de que apenas quando se souber o que efectivamente ocorreu ao longo de anos na Casa Pia de Lisboa e com o conhecimento de quem, mas também o que realmente se passou na condução do inquérito judicial a esses factos, se fará plenamente justiça.
Não pode ser passada uma esponja sobre crimes praticados numa instituição pública com um mandato tão sensível, nem o Estado pode demitir-se das suas responsabilidades ou escudar-se atrás de eventuais incompetências, erros ou omissões de alguns dos seus agentes em algum momento.

6. Tenho sido perguntado sobre o que vou fazer agora. Continuarei a bater-me pelas causas e pelos projectos em que acredito, onde sentir que posso ser útil, honrando os meus compromissos e com a mesma determinação de sempre.
É-me, no entanto, impossível ignorar as consequências de tudo aquilo por que passei. Um dos lados mais miseráveis da perseguição de que fui alvo foi a tentativa desesperada de semear e manter dúvidas, de prolongar até ao absurdo e de retorcer até ao delírio o vazio da acusação que me foi dirigida.
Essa atitude teve consequências pessoais de que demorarei a emergir, consequências políticas que não posso ignorar e provocou um arrastamento da decisão judicial no tempo que me obrigou a tomar decisões não facilmente reversíveis no imediato.
Ao fim de meses de espera, regressei plenamente à minha profissão, na minha instituição universitária e em funções internacionais de consultoria. Nesse âmbito, aceitei responsabilidades que não posso abandonar imediatamente. Mas, as muitas manifestações de solidariedade que recebi, e que hoje agradeço publicamente, deram-me razões para pensar que só continuando a defender as causas em que acredito posso honrar a coragem cívica dos que, comigo, nunca desistiram de lutar pela verdade.
Continuarei a ser um cidadão empenhado na vida do meu país. Continuarei a militar activamente no Partido Socialista. Assumirei, quando as circunstâncias o permitirem, o mandato de deputado à Assembleia da República.



Paulo Pedroso
6.12.2005