domingo, 12 de março de 2006

A Casa Civil do Presidente Cavaco Silva (corrigido)

  1. Há meses, defendi aqui no Canhoto que valia a pena ponderar a hipótese de que o projecto de Cavaco Silva ser, se eleito, o da "presidencialização suave" do regime político proposta por Rui Machete, presidencialização essa que, a meu ver, poderia bem dispensar uma revisão constitucional e realizar-se, em versão light, pela simples exploração de combinações bem urdidas entre os poderes formais e os poderes informais do Presidente da República.
  2. O discurso da tomada de posse - que contrasta fortemente com o tão elegante quanto sibilino discurso de Jaime Gama - veio confirmar que o Presidente da República quer definir a agenda política do que é preciso fazer e que, quantos aos temas mas não necessariamente quanto às políticas, converge largamente com as prioridades do Governo.
  3. Há quem, com base nisso, diga - e, a meu ver, possivelemente bem - que um tal discurso não pode senão aumentar a governabilidade do país, o que, sobretudo numa conjuntura em que a economia está longe de resultados excelentes e em que há decisões políticas dificílimas a tomar, só pode ser positivo.
  4. Mesmo que assim seja, o sinal dado pela escolha duma Casa Civil como a anunciada - onde há menos gente do CDS do que havia na de Jorge Sampaio e onde a nota dominante é a da experiência governativa em governos PSD - sugere que pode estar a caminho alguma coisa que, se não erro, pode vir a ser o equivalente funcional dum governo de "bloco central", feita a expensas da liderança de Marques Mendes no PSD, da periferização política do CDS-PP e dos partidos que se sentam na AR à esquerda do PS.
  5. Se é disso que se trata, tornar-se-ia muito clara a nova adjectivação usada pelo Presidente da República: a cooperação deixou de ser "institucional" para se dever tornar "estratégica"; à estabilidade passou a exigir-se que seja "dinâmica".
  6. Mas, se assim for, talvez valha a pena lembrar duas coisas: primeiro, como e quando terminou o governo do "bloco central" liderado por Mário Soares; segundo, de que lado estão os poderes constitucionais em caso de crise entre o Presidente da República, quelquer que venha ser a versão da eventual tentativa de presidencialização do regime
  7. É caso para dizer que espero estar a ser pessimista.