segunda-feira, 10 de abril de 2006

A concertação de médio alcance em pleno

Leio que o governo e os parceiros sociais chegaram a acordo (com excepção da CIP) sobre o tema socialmente sensível do subsídio de desemprego. Não conheço o texto final do acordo e não gosto de falar sobre informações genéricas. Mas há três aspectos no que vem à luz que me parecem muito relevantes.

1. Este acordo dá confiança aos parceiros sociais de que o governo não pretende protagonizar uma ofensiva precarizadora nas relações de trabalho, mas está seriamente determinado na busca de novos trade-offs entre flexibilidade e segurança. Vai no bom caminho, portanto.

2. Ele resulta de um processo de aproximação mútua, tecido laboriosamente após o que parecia uma saída em falso do governo e alguma demagogia em excesso de alguns dos parceiros. Houve o bom-senso e a capacidade de caminhar para posições reciprocamente aceitáveis, que é o contrário da evidência iluminada e autocentrada que, por vezes, se pressente ser o mais visível defeito da actuação do governo.

3. O resultado permite disciplinar o regime do subsídio de desemprego após alguns anos de vigência do regime existente, quer no combate sempre inacabado à fraude, quer no combate, ainda mais inacabado, à manipulação da lei. As quotas introduzidas para o recurso ao despedimento por mútuo acordo são, aliás, uma forma engenhosa de combater a tendência patronal de contornar as relações colectivas de trabalho, que trnsformavam em despedimentos individuais verdadeiros despedimentos colectivos massivos, tanto quanto limitam a tendência para a articulação perversa entre trabalhadores e empregadores que fazia o subsídio de desemprego entrar no cálculo das indemnizações a auferir nessas circunstâncias.

Quando o António Casimiro Ferreira crismou este tipo de acordos de concertação com a designação de "acordos de médio alcance", inspirando-se nas ideias de Robert Merton sobre os paradigmas, ainda não havia nenhum assinado nem sequer negociado, dado que estavamos a lançar o processo que conduziu aos acordos de 2001. Mas a imagem ainda hoje me parece feliz.
Curioso, também, será notar que a CIP parece estar a ter mais dificuldades de gerir este tipo de negociação do que a dos acordos grandiloquentes e fica, outra vez, isoladamente de fora de um acordo de concertação social.
Ainda de notar que este governo continua a conseguir na concertação social o que a maioria Barroso-Portas nunca conseguiu, a menos que consideremos o não-acordo sobre o Código Laboral.
Particularmente interessante também será ver a evolução nesta fase da relação das centrais sindicais cm a concertação, à medida que a CGTP parece querer libertar-se dos espartilhos que a levaram a não ser, por muito tempo, um parceiro com que fosse expectável celebrar acordos na concertação. Duvido, no entanto, com pena, que a flexibilidade desta central chegue para que valha a pena pensar tê-la no acordo necessário, que assim seria histórico, sobre as relações de trabalho.