Esclarecimentos a João Miranda (com adenda para Rodrigo Adão Fonseca)
João Miranda, aqui,acha que o que escrevi aqui sobre a pensão atribuida pela Caixa Geral da Aposentações ao cidadão Manuel Alegre e a que ele chama, deixando ver o que pensa, “milagrosa” não é esclarececedor. Como se deu ao trabalho de listar os pontos que considera não esclarecidos, o que agradeço, deu-me razões para lhe tentar explicar agora o que acha que não consegui antes.
1. Diz João Miranda, “Manuel Alegre justifica a sua pensão pelas contribuições feitas enquanto deputado, mas não nos diz quem fez as contribuições correspondentes à entidade patronal. Foi a RDP? Foi o Parlamento? Foi o Manuel Alegre?”.
Enquanto deputado, Manuel Alegre contribui para o regime de segurança social de que é beneficiário e terá uma pensão formada pelas regras desse regime. O de Manuel Alegre é a Caixa Geral de Aposentações. Os seus descontos foram feitos segundo as regras da CGA todos os meses sobre o seu vencimento de deputado. Onde está a questão?
2. Afirma também João Miranda, “O Correio da Manhã hoje diz que Manuel Alegre receberá uma segunda reforma enquanto deputado. Será mais um ataque a Manuel Alegre ou é mesmo verdade? A ser verdade, que contribuições é que justificam esta segunda reforma?”
É, de facto, mais um ataque. O cidadão Manuel Alegre, como qualquer outro beneficiário da CGA que chega aos 70 anos tem uma pensão de reforma. É essa a sua pensão. Mas, como é público, todos os deputados à Assembleia da República tinham, após pelo menos 12 anos de mandato, que Alegre já fez há muito, o benfício adicional de um subsídio mensal vitalício a receber depois de abandonarem essas funções. Este subsídio tem uma razão histórica de ser, se remontarmos a quando foi criado, mas já perdeu o sentido e deixará de existir a partir da próxima legislatura.
3. Afirma ainda João Miranda “Paulo Pedroso chega mesmo a defender um desses buracos [da segurança social]: a contabilização do tempo de exílio para efeitos de atribuição de pensões. Paulo Pedroso não explica que contribuições é que justificam essa contabilização. Não admira que a Segurança Social esteja falida. Andaram a atribuir pensões por tempo em que o beneficiário não contribuiu. Quem paga? Os beneficiários que contribuiram? Será isso a justiça social?”
Aqui, o problema é puramente de opção política. Eu acho da mais elementar justiça social compensar de alguma maneira as pessoas que foram presos políticos e que, por estarem presos, na clandestinidade ou condenados a viver no estrangeiro em condições precárias, não descontaram nesse tempo para nenhum regime de segurança social. Essa compensação vem e deve vir dos impostos e é devida a pessoas que reconhecidamente pagaram com anos da sua vida para que Portugal pudesse ser hoje a democracia liberal em que João Miranda acha que é injusto que um prisioneiro político seja compensado pela sociedade por aquilo que sofreu quando era uma ditadura. Ele acha que não, está no seu direito. Acho só que está profundamente errado.
4. O João Miranda já não tem nada a ver com este ponto. Mas, curiosamente, o Correio da Manhã entrou a semana em manchete contra a recontagem das carreiras dos militares de Abril, seguiu direito a Manuel Alegre, prosseguindo em direcção aos orgãos de soberania em sentido mais genérico. Quem serão os próximos?
PS. Rodrigo Adão Fonseca coloca-me aqui e aqui "uma série de perguntas simples". Só as vi depois deste post escrito e publicado. Não me leve a mal que, em vez de o reformular, considere que elas estão respondidas, embora no formato dos esclarecimentos a João Miranda.