segunda-feira, 23 de outubro de 2006

As políticas sociais públicas em questão

Primeiro, foi a proposta, feita pelo próprio PSD, de reserva de uma quota de mercado para as empresas financeiras no domínio das pensões.
Depois, foram as propostas de Manuela Ferreira Leite, feitas numa reunião organizada por uma confederação patronal, de que “o Estado deve sair de tudo quanto possível que possa ser feito pelo sector privado”, ao que terá acrescentado que a Constituição deve ser revista para dar às empresas maior facilidade de despedir trabalhadores, ainda que reforçando a protecção social no desemprego.
Acrescente-se a tese, defendida por António Barreto, de que as reformas em curso na educação só serão eficientes se e quando sairem de cena quer o Ministério da Educação, quer os sindicatos dos professores, de modo a assegurar um predomínio claro do local sobre o nacional.
Lembre-se o que, no campo da saúde, foi feito durante os governos Durão Barroso e Santana Lopes.
Juntem-se as declarações recentes de Pedro Ferraz da Costa, Miguel Cadilhe e Lobo Xavier quanto à alegada falta de ousadia da proposta de OE na redução mais rápida despesa pública, e temos o quadro completo.
Vistos em conjunto, o que estes factos significam é que a direita política está lancar um ataque frontal aos três principais vectores das políticas sociais públicas - a educação, a saúde e a protecção social – com um objectivo explícito – abrir campo para o sector privado – e com um argumento tão tentador quanto desastroso para a equidade social: reduzir a carga fiscal.
Ainda é – mas não é sempre? – um ataque pouco estruturado e com pontos de tensão entre algumas propostas e alguns protagonistas.
E, no meio disto, o que faz a “rua” mobilizada por um grande número de sindicatos?
Discute, como propõe António Chora em entrevista à “Pública”, como se protege e se cria mais emprego nos sectores expostos à concorrência? Apresenta propostas, compatíveis com a restrição orçamental e competição fiscal em curso na UE, para a melhoria da eficiência e da capacidade redistributiva dos serviços públicos? Discute o modo de desenvolver os direitos sociais?
Nada disso: a esquerda política que organiza a “rua” compraz-se com o facto de que as manifestações contra o governo actual serem maiores do que as que foi capaz de organizar contra o Código do Trabalho e os ataques ao Rendimento Mínimo Garantido feitos por Bagão Félix e Pais Antunes e vai polvilhando essas manifestações de insultos a Ministros e ao Primeiro Ministro, aqui e ali comparado a Salazar em cartazes erguidos quando as manifestações passam no Largo do Rato.
Lúcido e prometedor, não é?