When the time bell blows my heart
O mundo era um lugar pior antes do IPod. Há doze anos, optei por não levar mais do que dez discos para uma estadia longa, de um ano. O resultado foi que dei por mim a ouvir vezes sem conta os CD que levava e, como o tempo abundava, a ouvir em repeat os que fui comprando. Foram bons tempos, até porque ter 20 GB de trazer no bolso gera crises de abundância. No mundo antesdoIpod, um disco durava muito mais tempo e era como se fosse único. O álbum de estreia dos Portishead, comprado na HMV de Coventry, a cidade mais cinzenta (e feia) do mundo, que carrega ainda hoje o peso da Guerra como mais nenhuma das que conheço em Inglaterra, foi um desses discos. Não sei quantas vezes o ouvi, mas, hoje, acho que era difícil ter havido disco mais adequado àquele sítio e àquela estação. Há uns anos, a Beth Gibbons fez um disco com o Paul Webb dos Talk Talk (quando se reabilita tanta merda dos anos oitenta, custa a perceber o esquecimento que paira, por exemplo, sobre o Spirit of Eden), que sendo muito diferente dos álbuns dos Portishead, recupera parte da sua marca. Comprei-o e ouvi-o muito e outra vez longe de casa. Regressado, mesmo com intermitências, nunca mais lhe peguei. Mas com este vento sul que teima em não nos deixar, Lisboa parece-se mais com a estação em que ouvi isto. Esta versão é outra vez no Jools Holland e quase me havia esquecido que a música era tão boa.