Contra os almoços grátis: dinheiro por regras
Portugal é um país com um elevadíssimo nível de desigualdade social induzida pelo mercado, insuficiente corrigida pelas transferências sociais e pela política fiscal.
E é este país está a fazer um esforço gigantesco para salvar instituições bancárias que, por diversas razões, estão em crise.
Mas, se existem razões suficientes para, mesmo num país como o nosso, consagrar tanta energia e tantos recursos públicos para permitir que o BPP, o BPN e o BCP continuem no mercado, seria inadmissível que o esforço público que está a ser feito não fosse acompanhado da alteração das regras do jogo entre o poder político e o sistema financeiro.
Primeiro, porque, como os suscessivos casos estão a mostrar, as regras em vigor não passaram a provas dos factos. Mantê-las seria, pois, alimentar um sistema incapaz de suportar sem o apoio público as consequências dos seus actos, lícitos ou ilícitos.
Segundo, porque, num país com grandes níveis de carências sociais em múltiplos domínios, a atribuição ao sistema financeiro de recursos materiais e simbólicos da dimensão que está em causa só não será uma gigantesca iniquidade social se forem instituídas novas regras que (i) previnam novas crises deste tipo no futuro e (ii) assegurem que os bens públicos estão a ser usados para salvaguardar, mesmo que apenas indirectamente e a prazo, a posição dos que são socialmente mais fracos e mais carenciados.
Caso contrário, a moral da história seria a de que a regra de que não há almoços grátis - de que os neoliberais tanto gostam - passaria a ter uma excepção, aplicável aos que, duma maneira ou doutra, comem apenas o que gostam ... e arranjam modo de mandar a conta aos que comem apenas o que podem.