Populismo judicialista
1. Ouvi ontem nas televisões duas afirmações notáveis. Primeiro, que a um primeiro-ministro não se aplica o princípio da presunção de inocência (Joaquim Aguiar); segundo, que o Primeiro-Ministro José Sócrates não tinha ainda conseguido demonstrar claramente a sua inocência no chamado caso Freeport (António José Teixeira). Ouvi também dizer, a propósito de eventuais possíveis diligências futuras, que o Primeiro-Ministro era um cidadão como qualquer outro. Tive alguma dificuldade em compatibilizar as duas primeiras afirmações com a terceira.
2. O populismo daquelas observações é claro. O populismo, recorde-se, tem como uma das suas características a presunção de que todos os actores políticos são corruptos potenciais, sendo particularmente mortífero quando suportado por uma aliança entre sectores da comunicação social e da justiça. Em Itália acabou com a subida ao poder de Berlusconi. Mais mortífero ainda é o progressivo encastramento do populismo num média particular, a televisão. Neste caso, desenvolve-se o que Al Gore descreveu como “o ataque à razão”, facilitado pela profunda assimetria que caracteriza o funcionamento das televisões.
3. Ontem o dia das televisões foi fértil em exemplos não só daquele populismo judicialista como de uma técnica velha de mais de 2000 anos, frequentemente usada para incrementar a eficácia das campanhas negras: a construção da verosimilhança da inverdade conseguida através da multiplicação dos pormenores de uma qualquer história que podem ter alguma semelhança com a verdade. E depois querem que não suspeitemos da existência de campanhas…