sexta-feira, 11 de novembro de 2005

Motins: respostas à direita

Economicismo no CDS
O meu texto “Chirac no Canhoto” (09/11/2005), em que criticava a intervenção de Nuno Melo na AR sobre os motins em França, suscitou um comentário crítico de Rodrigo Costa:
Pensa então que devemos abrir as portas do país a mais emigrantes, mesmo sabendo que não temos condições de albergar e integrar os que já cá estão. Concordo com Nuno Melo, parece lógico que abrir as portas do país de forma indiscriminada leva a que as condições de os receber e integrar se degradem.

Refere-se este comentário a outra parte da intervenção de Nuno Melo que não a por mim criticada no texto referido. Nessa parte, o deputado do CDS argumentava ser necessário deixar entrar menos imigrantes pois só assim haveria condições para a sua integração. Não se perde porém o comentário pois não concordo também com este argumento de Paulo Portas agora recuperado por Nuno Melo (e que, em abstracto, parece fazer algum sentido).
Critico-o, antes de mais, porque usado no contexto em que foi usado sugere que a raiz dos motins é, em França, o “excessivo” número de imigrantes. E não é. O número de imigrantes em França é menor, em termos absolutos e relativos, do que em qualquer grande país de imigração do “novo mundo”.
Critico-o, em seguida, porque o argumento subentende que o problema da integração é, no essencial, económico: se deixarmos entrar gente a mais o bolo não chegará para todos. Ora, este argumento tem três erros. O primeiro, é pensar os imigrantes como consumidores de riqueza, não como produtores de riqueza. O segundo, é pensar que situações de penúria entre imigrantes ou seus descendentes se devem apenas a uma penúria absoluta generalizada, esquecendo a existência de uma crescente desigualdade. O terceiro, é propor uma visão exclusivamente materialista do problema da integração, esquecendo os graves problemas identitários resultantes da incapacidade de a França, como Portugal ou outros países europeus, transformar estrangeiros em novos cidadãos.
Critico-o, por fim, em termos mais empíricos do que lógicos. Quando o Governo da coligação PSD/CDS geriu a imigração com base na palavra de ordem de Paulo Portas, o incremento do controlo só existiu no papel, assim se piorando as condições de integração dos imigrantes. Os imigrantes continuaram a entrar, mas como não lhes eram concedidas autorizações para se fixarem faziam-no ilegalmente. E não há pior ponto de partida para um percurso de integração do que a situação de irregularidade do imigrante.

Julgar e explicar
Como Rodrigo Costa é um comentador civilizado, assinou o seu comentário revelando-me, desta forma, a existência do blogue com o seu nome. Nestes casos vence sempre a curiosidade, pelo que espreitei o dito blogue, onde deparei com a seguinte frase:
A esquerda lacoste bate palmas aos causadores dos motins em França, afinal são jovens pertencentes a minorias que os causam e como tal, estão automaticamente inocentados.

Pode ser que haja quem se reveja nesta caracterização. Eu não. É fundamental separar a explicação de um fenómeno do julgamento dos que nele participam. E o meu julgamento sobre o que se passa em Paris é claro: a violência daqueles jovens não pode ser tolerada, devendo ser, quanto antes, reposta a ordem pública por meios policiais.
Mas como, e reafirmando algo já dito antes, nenhuma sociedade sobrevive muito tempo se recorrer sistematicamente à violência para repor a ordem pública, é indispensável não só julgar mas também explicar. Explicar, sobretudo, como é possível que num país como a França haja condições favoráveis à formação de jovens capazes dos comportamentos que temos visto. E sobre isto reafirmo tudo o que já disse, e que pode ser resumido num comentário seco à crónica de Vasco Pulido Valente no Público de hoje (11/10/2005).

A culpa: estado social ou estado nacional?
Vasco Pulido Valente responsabiliza o estado social pelo comportamento dos jovens franceses amotinados. Eu responsabilizo sobretudo os governos das etnonações europeias pela resistência que manifestam a transformarem estrangeiros imigrantes em novos cidadãos europeus. Claro que V.P.V. nunca poderá concordar com esta responsabilização, sendo, como é, um dos mais aguerridos “intelectuais orgânicos” da nação…