domingo, 18 de dezembro de 2005

O CRUP contra a autonomia universitária

A autonomia universitária foi sempre mal amada, mesmo quando recebia declarações de amor incondicional.
Mal amada por grande parte dos governos porque fragmenta o universo dos interlocutores e obriga a uma avaliação exigente do exercício dessa mesma autonomia. Mal amada pela maioria dos reitores porque traz responsabilização acrescida destes e se traduz num ambiente competitivo aberto entre universidades.
O Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas (CRUP) constituiu, neste quadro, a arma preferida dos que mais se opõem à autonomia universitária. Porque, em primeiro lugar, permite uniformizar administrativamente o ambiente universitário, dispensando avaliação exigente e reduzindo quanto baste a concorrência. E porque, em segundo lugar, permite a desresponsabilização dos protagonistas, tanto de reitores que se desculpam com a vontade do colectivo, como de governantes que se desculpam com as exigências da participação. Quando convergem estratégias de reitores e de governantes, aperta-se o nó do corporativismo como em poucos outros sectores da vida nacional.
Temos, hoje, um ministério do Ensino Superior que faz da autonomia a leitura adequada: autonomia universitária é autonomia de cada universidade, não “autonomia” do conjunto das universidades. O que, inevitavelmente, reduz o poder corporativo do CRUP e a co-governação corporativa do sistema do ensino superior pela parceria CRUP-Ministério. Incrementando, em contrapartida, a concorrência inter-universitária e a responsabilização dos governos das universidades. Os quais reagem, procurando reduzir os prejuízos subsumindo, de novo, a autonomia no espaço do CRUP.
As últimas manifestações da acção do CRUP contra a autonomia universitária exprimem um misto de desespero, de espírito burocrático e de irresponsabilidade normalizadora. De desespero, quando procuram impor uma uniformização dos critérios de Bolonha, tentando, pela enésima vez, sem sucesso, exigir a obrigatoriedade de licenciaturas de quatro anos e recusar a possibilidade da coexistência de licenciaturas de três e de quatro anos. De espírito burocrático, quando decidem negociar uma lista fechada de designações de licenciaturas em lugar de proporem critérios relativos à formação em primeiros ciclos de banda larga e à sua avaliação. De irresponsabilidade normalizadora, por fim, quando decidem que os critérios formais de acesso ao ensino superior serão os mesmos para todos os cursos, mesmo correndo assim o risco de deixarem de fora, arbitrariamente, todos os anos, milhares de candidatos à Universidade.
Em todas estas iniciativas do CRUP, a ideia obsessiva de normalizar, normalizar, normalizar, recusando o corolário óbvio da autonomia: o incremento da heterogeneidade do ensino superior, saudável desde que sujeita a avaliação.