quinta-feira, 16 de março de 2006

Seu intelectual!

1. Ludgero Marques falou. E disse, terça-feira passada, em conferência no ISEG, que os “intelectuais” falharam na resolução dos problemas do desenvolvimento. E disse-o com o desprezo devido. Não está só, o mais frequente entre nós é que o termo “intelectual” seja usado para depreciar alguém, quando não mesmo para insultar o adversário do momento. Com muito mais virulência, aliás, do que a usada por Ludgero.
Ora, intelecto é, segundo o dicionário, a “faculdade de conhecer, de compreender e conceber”. Se conhecer é defeito e intelectual é aquele que tem a faculdade de conhecer, quando se usa o termo com sentido pejorativo só por demagogia se pode, ao mesmo tempo, falar, por exemplo, em “caminhar para a sociedade do conhecimento”.
Conclusão: um país em que a palavra “intelectual” passou a ser usada como insulto é um país que não tem condições para se modernizar.

2. Lamentou também Ludgero o “afastamento entre a escola e a realidade empresarial”. Não questionando a necessidade de um muito maior investimento na formação profissional e nas vias técnicas de ensino, convirá, porém, eliminar dois pressupostos que estão frequentemente associados àquela afirmação.
O primeiro, é que as empresas não têm um papel a cumprir na formação profissional específica de que necessitam, tendo por base as qualificações gerais que a escola proporciona. Têm, ou deviam ter, pois a escola não forma, nem deve formar, profissionais à medida.
O segundo, é que a formação tem que ser avaliada em função da sua utilidade, não se reconhecendo a utilidade do conhecimento em si. Desvaloriza-se desta forma a curiosidade intelectual e, consequentemente, compromete-se a aquisição das competências necessárias à resolução de problemas. Esquecendo-se que quem não estiver treinado para mobilizar os conhecimentos adquiridos na resolução de problemas dificilmente será um profissional competente.
Conclusão: um país onde se desvaloriza a curiosidade intelectual é um país que não tem condições para formar profissionais competentes.

3. A resposta a estas desvalorizações passa por restabelecer o valor positivo do termo “intelectual” e por chamar a atenção de que o contrário de “intelecto” é a ignorância: “Seu intelectual? Pois, certamente, e com orgulho seu ignorante!”