quarta-feira, 19 de abril de 2006

O controlo dos deputados

O PS anunciou ontem que, na sequência da falta de quorum numa votação programada na Assembleia da República, vai propôr que o registo de presenças nas votações seja contado como um controlo de assiduidade adicional à assinatura do livo de presenças.
Concordo com a preocupação em encontrar respostas para o problema criado. Acho bem que se elimine o escândalo diário dos deputados que vão "assinar" e se retiram sabe-se lá para onde, fazer sabe-se lá o quê que nada tem a ver com as funções para que foram eleitos.
Nem sequer me oponho a que haja os mais variados controlos de assiduidade dos deputados. Mas há um limite que não pode ser ultrapassado, quanto ao exercício das competências dos deputados, que é o da sanção administrativa de gestos políticos.
Quando Manuel Alegre não participou na votação do Orçamento de Estado teve um gesto político discutível mas não "faltou" à votação. Decidiu não participar nela.
Não participar numa votação tornou-se numa forma, quase a única, aliás, de contornar a disciplina partidária quando se discorda de uma decisão do grupo parlamentar em que se está inserido.
Desde que se salvaguarde, o que é fácil, a diferença entre o incumprimento dos deveres e a expressão de divergências, a iniciativa do grupo Parlamentar do PS é uma boa resposta à questão das faltas às votações.
Mas, infelizmente, o Parlamento não tem o hábito de se salvaguardar suficientemente nem de defender a credibilidade dos deputados. Veja-se a forma como são divulgadas listas de faltas em que se fazem "tops" de faltosos, misturando pessoas que tiveram doenças sérias e outras que não estão nos plenários porque se encontram ao serviço da própria Assembleia da República com quem tem mais que fazer do que dar-se ao incómodo de exercer o mandato para que se fez eleger.
A oportunidade da iniciativa do PS poderia ajudar a clarificar também as ausências aos plenários. Se o Presidente da AR se desloca à posse de um Presidente de outro Parlamento ou se um líder partidário da oposição tem uma iniciativa na sua agenda não estão a ter um comportamento comparável ao do deputado que tem que tratar de umas coisa à hora do plenário e, no saco das faltas justificadas, acaba tudo misturado.
O Parlamento devia, por isso, separar claramente as ausências em serviço e os impedimentos, de um modo claro, das faltas. Devia registar as ausências a votações por opção política de modo diferente da falta à votação e deveria ter um estatuto que salvaguardasse as ausências, por exemplo, dos líderes partidários ou de deputados com razões especiais (como, por exemplo, serem candidatos a Presidente da República), porque, quando produz e divulga listas de faltas não é uma empresa a medir a assiduidade dos seus funcionários, mas um orgão de soberania a analisar o cumprimento de um dever por parte dos seus membros.