quinta-feira, 7 de setembro de 2006

O PCP e as FARC: um apoio sintomático e, agora, notório

A propósito da presença das FARC na Festa do Avante levantavam-se diferentes questões. As primeiras estão resolvidas: o PCP convidou-as a estarem representadas através do seu orgão de propaganda e está solidário com elas, pois considera-as, como se pode ler no comunicado que hoje difundiu: "uma organização popular armada que há mais de 40 anos prossegue, entre outros objectivos, a luta pela real democracia na Colômbia e por uma justa e equitativa redistribuição da riqueza, dos recursos naturais da Colômbia e da posse e uso da terra".

Como escrevi no primeiro post que escrevi sobre esse assunto, tal convite
consegue ainda ser mais sintomático que estranho. Nunca, depois do início da miserável política de sequestros da FARC, que as colocou ao nível do pior banditismo e da chantagem dos traficantes de droga,o PCP tinha ido tão longe em público e oficialmente.
Mesmo quando, em entrevista a um jornal colombiano, José Saramago chamou as FARC pelo nome, e disse que não eram uma guerrilha, mas sim bandos armados e que "eles não são comunistas. Talvez no início tenham sido, agora não", o PCP manteve-se oficialmente e ao Avante calados, apenas surgindo a demarcação num site ultra-ortodoxo e pelas mãos de Jorge Figueiredo, José Paulo Gascão, Miguel Urbano Rodrigues e Rui Namorado Rosa .

De facto, o apoio do PCP às FARC tem sido convenientemente discreto e reservado a iniciados. Agora, inevitavelmentedeixou de o ser. Estão esclarecidas as primeiras questões - o PCP recebeu e apoia politicamente as FARC - há muitas outras que devem ser colocadas:

a) o PCP considera legítimo o sequestro de civis e a sua retenção, ao longo de anos, incomunicáveis na selva, ainda que em nome de uma "guerra popular"?
b) o PCP considera legítimo que em nome dessa guerra sejam estabelecidos laços com o tráfico de droga?
c) o PCP solidariza-se com o lançamento de bombas sobre civis indefesos e a provocação indiscriminada de mortes entre cidadãos inocentes?
c) o PCP condena ou não que uma cidadã em campanha eleitoral - que por acaso até estava a incomodar muito o sistema e os traficantes de droga - seja raptada e mantida em cativeiro durante vários anos?
d) o PCP exige ou não a libertação imediata dos sequestrados das FARC?

Se o PCP está solidário com quem tem este tipo de actuação e consegue reduzi-la a uma mera e hipotética discordância de métodos tem o direito de o fazer e os cidadãos têm o direito de o saber. Cada um tirará as suas conclusões.
Não me cabe a mim avaliar o PCP à luz dos seus próprios princípios, mas a posição que tem sobre este asunto afasta-o muito, mesmo muito, até da sua própria posição histórica sobre a guerrilha e os movimentos guerrilheiros. Por isso, repito, o apoio do PCP, agora notório, às FARC, é sintomático.

PS. Veja no Tugir e no Kontratempos, que primeiro levantaram a questão, as listas actualizadas de referências na blogoesfera ao assunto.