Do rigor e da sua falta
1. O já mais do que referido, mas raramente citado, relatório do painel norte-americano sobre o ensino da matemática (The Final Report of the National Mathematics Advisory Panel), é agora invocado, mas também não citado, por Nuno Crato. E com a mesma falta de rigor (para sermos simpáticos) de José Manuel Fernandes (esta já devidamente assinalada na Câmara Corporativa).
2. Diz Nuno Crato na Única, do Expresso, de 5 de Abril (p. 101): “Afirma-se [no relatório], por exemplo, que os estudos existentes não permitem defender o chamado ‘ensino centrado no aluno’”. Ora, o relatório trata este assunto numa secção intitulada “Teacher-directed and student-centered instruction in mathematics”, concluindo não estar provado que seja vantajoso o uso exclusivo de qualquer uma daquelas orientações. Citando: “All-encompassing recommendations that instruction should be entirely ‘student centered’ or ‘teacher directed’ are not supported by research. If such recommendations exist, they should be rescinded. If they are being considered, they should be avoided. High-quality research does not support the exclusive use of either approach” (p. 45).
3. O mesmo acontece em relação a outros dois exemplos usados por Nuno Crato: o uso da máquina de calcular e o recurso a problemas reais. Nuno Crato diz que o relatório defende não estarem provadas as vantagens destes instrumentos, o relatório diz ser necessário evitar o uso desses instrumentos como método único no ensino da matemática. Ou seja, o relatório recomenda, e bem, que se evite a absolutização das vantagens de qualquer pedagogia específica e recomenda, em alternativa, a sua combinação bem ponderada. Cabendo como é óbvio aos profissionais, isto é aos professores, e não aos decisores políticos, a realização dessa ponderação no contexto da sua actividade.
4. Pena que ao ler Nuno Crato não possamos sentir o mesmo “estímulo ao rigor” que este diz ter sentido ao ler o relatório americano.