Onde param os arautos do populismo oportunista?
Há dois dias atrás sustentei aqui que (i) a crise dos combustíveis seria um potente revelador de tensões até agora ocultas e que, por isso mesmo, ela só poderia ter uma resolução aceitável se (ii) a concepção e a aplicação de medidas de fundo fosse separada da (iii) resolução das questões de forma, que obrigavam a repor a legalidade democrática.
Nos últimos dias, os arautos do populismo bota-abaixista - quer da direita, quer do BE e do PCP - não tiveram uma palavra contra os desmandos e as flagrantes violações das liberdades que os media abundantemente nos mostraram.
Jogando a fundo na oportunidade política criada pela crise genuína dos pequenos transportadores - que Ângelo Correia teve o cuidado de explicar na SIC Notícias que não eram nem de esquerda nem da CGTP - o CDS reclamou reduções de impostos, Santana Lopes e Manuela Ferreira Leite primaram pelo silêncio, e o BE e o PCP comprazeram-se, em plena situação de crise, em contribuir para a redução da governabilidade do país, tentando beneficiar, mesmo que marginalmente, do que poderia ter sido uma crise aguda e crescente do abastecimento público, com largas potencialidades desestruturadoras.
Uma vez mais, quanto a sentido das responsabilidades e à primazia do bem público, estamos conversados: tivemos, do CDS, do PSD, do PCP e do BE, o que seria de esperar, isto é, nada que mereça respeito.
Veremos o que acontece nos próximos dias. Mas ficaria muito espantado se nada mais vier à luz do dia quanto à regulação do mercado dos combustíveis, quanto ás tensões internas no sector dos transportes de mercadorias e quanto ao sistema de respresentação dos empresários.
Mas lá que estamos a caminhar para decisões de grande impacto no conjunto da sociedade portuguesa, lá isso parece inquestionável. E, se assim fôr, lá ficaremos todos a saber um pouco melhor o que representam, para além da retórica, as súbitas preocupações da direita com a questão social e até onde pode ir a deriva populista do PCP e do que Jerónimo de Sousa chamou, com inegável sentido de oportinidade e de humor, a "esquerda falante".