quinta-feira, 8 de janeiro de 2009

Porque não defendo a táctica do tabu sobre a governabilidade do país

Vital Moreira voltou ao tema dos anúncios prévios de fórmulas de governo pós-eleitorais. Como tenho sido, julgo, a única pessoa do PS a falar abertamente do tema, acho que é útil que esclareça o que penso e porque o penso.
Defende ele que o PS não deve fazer nada que desfoque o eleitorado do seu objectivo que é o da renovação da maioria. Concordo com ele nesse ponto, mas chamo a atenção para o carácter aleatório das reivindicações de maioria absoluta. O PS nunca teve, nem nas últimas eleições, resultados que possam dar-lhe a confiança antecipada numa maioria absoluta. Pequenas variações no nível de votação do maior partido ou na distância entre este e o segundo partido podem dá-la ou tirá-la. Daí que a táctica erija o resultado em argumento e nos devamos perguntar, antes, o que podemos fazer hoje para tornar mais possível uma maioria absoluta do PS.
Vital Moreira pensa que esconder o jogo amplia a base eleitoral. Eu apenas penso que há conjunturas em que sim e outras em que não. Por razões conjunturais, não creio que hoje o PS ganhe capital de simpatia e apoio popular por aparecer aos eleitores como um partido arrogante que se julgue o detentor único de soluções para o país.
Por outro lado, por razões de fundo, penso que erra se der ao eleitorado o sinal de que é equidistante de todos os partidos à sua esquerda e à sua direita. O PS não tem procurado e não deve procurar ser o centro rigoroso do sistema político. Julgo que deve partir da esquerda para a cnquista do centro, ganhar quando o consegue e perder quando deixa que a direita o conquiste, em vez de tentar transformá-lo no seu lugar natural.
Como pode, então, um partido de esquerda que ambiciona a maioria absoluta, apresentar a questão da governabilidade do país sem a comprometer?
Penso que o PS deve balizar-se pelo reconhecimento da existência de duas reacções negativas no eleitorado em relação à governabilidade do país pelo PS: (a) há sectores que se mobilizam para que haja um Primeiro-Ministro do PS mas não se mobilizam para que ele tenha maioria absoluta (que julgo serem hoje muito superiores aos que se mobilizam para uma maioria absoluta seja de quem for); (b) há um balanço negativo dos governos minoritários do PS e das consequências de enfrentarem coligações negativas entre esquerda e direita.
Julgo ainda que deve ter presente que o próximo ano decorrerá sob uma crise económica em risco de agravamento constante e que o tempo não estará para governos frágeis.
A minha divergência com Vital é do domínio da avaliação dos efeitos eleitorais de um tabu sobre a governabilidade do país. Ele está absolutamente convencido que ele potencia eleitoralmente o PS, porque admitir explicitamente que pode não ter maioria absoluta o diminui e porque admitir implicitamente que pode haver coligações com qualquer partido excepto o CDS/PP faz fugir ou eleitorado ao centro ou eleitorado à esquerda. São axiomas que fazem parte da família das leis políticas que os resultados eleitorais de vez em quando desmentem.
Em contraponto, penso que o PS deve aparecer como o partido que garante que fará um governo forte para enfrentar a crise respeitando as escolhas dos eleitores. E deve, antecipadamente, assumir as suas responsabilidades e confrontar cada um dos outros partidos com as deles.
Excluir o partido mais à direita do espectro político, que tem posições xenófobas, chantageia o eleitorado com temas de segurança e tem uma liderança hoje totalmente encostada a todos os temas que se prestem ao populismo seria um sinal de seriedade e de que o PS não quer, de modo nenhum, pactuar com delírios autoritários de direita nem com demagogos populistas.
Deixar claro que o país tem que ser governado no respeito pelos seus compromissos internacionais e com sensibilidade social, sendo os políticos suficientemente humildes perante os eleitores para lhes confiarem abertamente uma quota parte de responsabilidade nos destinos do próximo governo para além da confiança no partido vencedor, parece-me que aumentaria a nossa credibilidade à esquerda e à direita.
Acresce que os portugueses têm dado sinais crescentes de que o tema da governabilidade é um tema em que querem ter voz, ao contrário do que as agendas partidárias têm postulado.
Há, contudo, um ponto em que concedo razão a Vital Moreira, porque vejo o risco de tornar confortável para cada segmento do eleitorado optar por partidos que não tentam ganhar, para que tentem influenciar o que vencer e o efeito agregado desse comportamento seja a diminuição eleitoral do maior partido. Assumo essa limitação e por isso não transformo o que defendo em postulado mas em ponto para discussão, coisa que acho quepodia ser feita até ao Congresso do PS. Depois, a tese que vencer deveria ser defendida com disciplina. E tudo aponta para que seja a de Vital Moreira. Ou seja, a convicção de que o tabu é mais rentável que a confrontação de cada partido com as suas responsabilidades. A entrevista de José Sócrates à SIC, contudo, matou o tema. Respeito.
Finalmente, a questão dos acordos com o CDS. A minha posição é clara e é pública: um governo do PS viabilizado pelo CDS que hoje existe daria razão aos que dizem que o PS abandonou a esquerda. Aí, diga a táctica o que disser, passa-se uma fronteira que, nas condições políticas de hoje, acho que devia ser inequivocamente estanque. Mas compreendo que se o tema das alianças for matéria interdita,não se queira excluir nada. Felizmente para os defensores desta táctica não há risco de o MRPP ou a PNR elegerem deputados, porque se houvesse também eles não deveriam ser abertamente excluidos para não se violarem as matérias interditas.