Racismos
Racistas com Bush
O racismo político, e não apenas o fundamentalismo neoliberal, ajuda a explicar parte da demissão do Estado bushiano das suas funções humanitárias em Nova Orleães, enquanto o facto não se tornou um escândalo internacional.
De entre as várias organizações conservadoras, ou mesmo reaccionárias, que ajudaram Bush a chegar à Casa Branca, contam-se os revivalistas da Confederação derrotada na Guerra Civil americana, que têm por objectivo expresso reintroduzir um sistema institucionalizado de subordinação racial nos EUA. O seu principal jornal foi o Southern Partisan, ao qual John Ashcroft, nomeado Procurador-Geral por Bush no seu primeiro mandato, daria uma entrevista em 1998 defendendo a honra do presidente da rebelião sulista esclavagista, Jefferson Davis: “[Y]our magazine also helps set the record straight. You’ve got a heritage of doing that, of defending Southern patriots like [Robert E.] Lee, [Stonewall] Jackson and [Confederate President Jefferson] Davis.” (citado em Douglas S. Massey, The Return of the “L” World, Princeton, Princeton University Press, 2005, p. 140, livro recomendado no Canhoto no seu primeiro dia de funcionamento).
Sem querer fazer processos de intenção, não é possível deixar de suspeitar de quem se alia a gente declaradamente racista: no mínimo, terá a sua sensibilidade anestesiada para com o problema de Nova Orleães.
Citação e comentário
Dos EUA vem-nos tanto o mau exemplo do racismo como o das más alternativas ao mesmo. Em particular, quando se cai no equívoco de pensar o anti-racismo como a igualização das raças, e não como a superação das categorias raciais, como bem o diz José Eduardo Agualusa:
«Parece-me, porém, que o Brasil goza de uma enorme vantagem em relação aos Estados Unidos —existe desigualdade entre brancos e negros, sim, prevalece ainda um forte racismo, mas não há sinais de paranóia racista. Quando Gilberto Gil, para dar apenas um exemplo, foi nomeado Ministro da Cultura, o facto de ser negro não foi tido em conta. […] Nos Estados Unidos, pelo contrário, não se organiza um governo, uma esquadra de polícia, ou uma simples colectânea de poesia, sem ter em conta a suposta raça, seja lá isso o que for, dos respectivos intervenientes. O grande desafio do Brasil é, pois, conseguir uma maior justiça social/racial sem se deixar cair na paranóia. O racismo só estará extinto quando se extinguir o conceito de raça.» [José Eduardo Agualusa, “O gigante cordial”, Pública, 4 de Setembro de 2005, p. 8].
Gostava de ser tão optimista sobre o Brasil como J.E. Agualusa. Mas fiquei céptico quando, na UNICAMP, em Campinas, deparei com um cartaz anunciando a realização de mais uma edição de um congresso de cientistas sociais… negros!