segunda-feira, 24 de outubro de 2005

Rankings

Quer transformar algo muito simples numa operação de aparência técnica muito sofisticada? Simples, designe esse algo em inglês. Em próximas conversas sobre futebol terá sucesso garantido se em vez de discutir a “classificação” do campeonato, exprimir a sua opinião sobre o ranking da Liga. Pode fazer o mesmo quando falar de escolas. Em lugar de ter um trabalhão a avaliá-las, classifique-as com critérios simples realizando uma operação de aritmética básica ao alcance de qualquer bom aluno do ensino primário. Mas não se esqueça, para lhe dar um ar sofisticado nunca fale em classificação das escolas, fale sim em ranking das escolas.
Este ano, uma vez mais, fomos bombardeados com os tais rankings das escolas secundárias elaborados pelo Público e pelo Expresso. Ou seja, com a classificação daquelas escolas com base no critério mais simples possível: a média das notas dos alunos dessas escolas nos exames nacionais do secundário. Por outras palavras, transformando as classificações dos alunos em classificações das escolas.
Pergunta: podemos classificar escolas, apenas, com base nas classificações dos seus alunos?
Resposta: não! E não porque as classificações dos alunos combinam o mérito destes com o mérito das escolas, não sendo verdade que todo o mérito dos alunos derive do mérito das escolas.
Conhecendo estas limitações, podemos, apesar de tudo considerar que a classificação dos alunos é um indicador razoável, ainda que pouco rigoroso, para classificar escolas? Duvido, mas de certeza que não com os poucos cuidados técnicos e metodológicos que estiveram presentes nas classificações divulgadas pela imprensa.
Poucos cuidados, em primeiro lugar, porque trabalham com uma escala de classificação muito discriminada (0 a 100 com uma casa decimal extra) que presume um rigor que o indicador não tem. O que explica depois que pequenas decisões sobre os dados a considerar na classificação tenham grandes efeitos sobre essa mesma classificação, com, por exemplo, a mesma escola em 53.º lugar numa lista (Expresso) e o 81.º lugar noutra lista (Público). “Apenas” 28 posições de diferença!
Cuidados que são ainda menores no caso da classificação elaborada pelo Público. Nesta, o primeiro lugar é ocupado por uma escola que, este ano, levou a exame 20 meninas (e cinco o ano passado). Em reportagem, o Público tenta identificar as razões do sucesso do pequeno colégio feminino do Restelo apoiado pela Opus Dei. Eu faço uma sugestão alternativa. Comparem-se as notas dos 20 melhores alunos de cada escola e faça-se uma nova classificação. Talvez assim se entenda como pode ser fácil ter uma boa classificação nestas listas da imprensa: basta seleccionar um número reduzido de alunos e bater com a porta na cara dos restantes.
Última questão: porquê tanto alarido em torno de trabalho tão elementar?
O título do Público ajuda a perceber o que está em jogo: “Escola privadas, católicas e do litoral mantêm-se no topo da tabela das melhores médias nos exames”. Para nos recordar do que está em jogo, o Expresso, por sua vez, resolveu destacar graficamente, nas suas listagens, as escolas particulares.
Apenas falta fazer o ranking dos jornais na ofensiva contra a escola pública. Para já, ganha o Público.