Perplexidades
Ouvi (09/02/2006) a entrevista do Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros na SIC Notícias. No fim, ficaram-me mais duas razões para perplexidade.
1. Estranhou o Ministro que não se entendessem os efeitos das caricaturas nos países islâmicos, dado que nestes existiria uma cultura política completamente diferente da ocidental. Nomeadamente, não se distinguiria, no mundo islâmico, entre esfera pública e esfera privada ou entre estado e igreja. Não vou discutir os méritos da análise mas não percebo a conclusão. No chamado caso das caricaturas publicadas por um jornal local dinamarquês, na Dinamarca (e não num país islâmico), o que se viu foi uma pressão para que a Europa adoptasse aquelas mesmas características de não separação entre público e privado ou entre estado e igreja, não uma pressão para que o mundo islâmico as abandonasse. As caricaturas só tiveram efeitos em alguns países islâmicos quando estes entenderam que na Europa deveriam existir as mesmas regras que as tornavam problemáticas nesses países.
2. Como não percebo a conclusão de que a crítica ao comunicado do Ministro pressuporia a não existência de limites à liberdade de expressão. Claro que há limites à liberdade de expressão. A lei inclui aqueles limites, no domínio criminal, sempre que são causados prejuízos a terceiros concretos: por exemplo, a difamação de pessoas individuais ou colectivas; ou o incitamente público à violência e ao crime. Mas não conheço qualquer disposição relativa a crimes de desrespeito de símbolos religiosos. Argumenta o ministro que sendo os símbolos religiosos tão essenciais, não faria sentido que neste caso não se considerasse também legítima a existência de limites à liberdade de expressão. É uma opinião. Mas aqui radica a minha segunda perplexidade, pois não sabia que uma opinião fazia lei ou razão de Estado quando professada por um ministro.