A degradação da vida parlamentar
A Páscoa tem sido usada para dar mais uma machadada na já frágil credibilidade do Parlamento e da actividade parlamentar. Mas há aspectos bem mais nefastos para a imagem (e para a actividade) dos deputados do que a polémica das faltas. Aliás, falar das faltas é uma boa forma de não se falar de assuntos bem mais importantes – como já foi aqui notado, por exemplo, a degradação dos momentos das votações.
O debate mensal com o primeiro-ministro é um bom observatório de problemas da AR e o que se passou com a primeira intervenção de Marques Mendes, hoje, é disso exemplo. Há um tema. O Governo apresenta um conjunto de medidas – no caso concreto, aliás, estão longe de ser, como noutras ocasiões, proclamações vazias, mais ou menos propagandísticas – e o líder da oposição pura e simplesmente não fala do assunto.
A prática não é nova nestes debates. Sistematicamente as oposições fogem ao tema e falam de tudo menos daquilo que está agendado – Louçã, com assinalável sucesso mediático, é mestre nisso mesmo. Mas haverá melhor exemplo de degradação do que o Governo falar de Segurança Social e Marques Mendes desconversar? Haverá melhor exemplo de degradação da actividade parlamentar do que um partido falar de alhos e o outro responder com bugalhos? Os debates com o primeiro-ministro não são de facto debates com o primeiro-ministro, são antes tentativas de todas as partes em marcar a agenda, mesmo que para isso se use e abuse da graçola para os telejornais da noite e da tirada de belo efeito, mas politicamente vazia.
O problema não é naturalmente de Marques Mendes. O problema é que talvez os debates parlamentares não devessem ter este modelo, por exemplo podiam ser abertos a perguntas, de facto, da oposição ao Governo. E, acima de tudo, é claro que, no caso de hoje, é difícil para a oposição falar de segurança social quando esta soube qual era o tema do debate ontem a meio da tarde e, com o esvaziamento dos partidos em Portugal, pura e simplesmente não tem capacidade de produzir posicionamento político em meses, quanto mais em 24 horas.
O que são livros de pontos e faltas ao pé do vazio a que se assiste em momentos nobres da vida parlamentar como os debates com o primeiro-ministro?